Qual será a nossa reação, caso
alguém sugira que nos tornemos seus imitadores? Não! Não aceitamos que um homem
tenha a pretensão de se tornar nosso modelo de vida e de ação. É até possível
que nós próprios escolhamos nossos modelos para imitação; todavia, permitir que
o próprio indivíduo se apresente como tal é um grande absurdo! Afinal, não
servimos a homens, mas a Cristo. Jesus é o nosso modelo. Será esse um
raciocínio correto, relativamente ao que diz algumas vezes o apóstolo Paulo?
Para bem compreender o
assunto, é necessário verificar que todo processo de comunicação prevê uma
mensagem, a qual se consolida por alguma forma de linguagem (mormente oral ou
escrita, para o caso em pauta).
Entendendo-se, pois, a
linguagem como um sistema de códigos, estabelece-se a necessidade de uma
(correta) leitura. Exatamente no ponto da leitura é que, geralmente, nascem as
dificuldades para a boa compreensão da mensagem. O impasse entre a mensagem e
sua captação recebe o nome de ruído.
Entre outros ruídos que ocorrem na recepção de uma mensagem, há grande
incidência dos problemas chamados, um, de redução,
e outro - seu oposto - de extrapolação.
Entende-se por redução a
leitura parcial, que não observa, em sua totalidade, a carga informativa do
texto. O leitor contenta-se com uma parte do conteúdo, sem verificar toda a
extensão do significado do texto. Por outro lado, a extrapolação consiste nos
acréscimos que o leitor insere à revelia do texto. Geralmente a extrapolação
resulta de um deslize de lógica textual, que normalmente chamamos de “achismo”.
É muito grande a incidência
dos problemas aqui levantados, no âmbito da má exegese (se é que pode existir
má exegese!) dos textos bíblicos. Isso ocorre porque muitos “pregadores” não se
preocupam com o estudo sistemático da Bíblia, contentando-se com partes e
partículas extraídas do texto e manipuladas a seu bel-prazer.
Tais pregadores representam
bem as reuniões domiciliares de antigamente, quando cada pessoa retirava de uma
famigerada “caixinha de promessas” um versículo “profético”. Lembra o
velhíssimo realejo das praças. Também não é raro ainda hoje encontrarem-se
“quadrinhos” com versículos bíblicos nas paredes de muitas residências: “Posso todas as coisas naquele que me
fortalece”, como um talismã ou um pé de coelho da sorte.
A Bíblia explica a Bíblia e a
justifica. Sem estudá-la com coerência, disciplina, sistematização e, acima de
tudo, oração em comunhão com Deus, o resultado pode ser nulo ou desastroso.
No início deste texto parece
que faço alusão a um posicionamento vaidoso do apóstolo Paulo, quando conclama,
em mais de uma de suas cartas, os leitores para imitá-lo. Parece uma ousadia
sem tamanho. Seria Paulo o modelo de perfeição? Como pode o apóstolo
interpor-se como protótipo dos imitadores de Cristo, afirmando: “Tornem-se meus imitadores como eu o sou de
Cristo.”? Por acaso, ele não poderia chamar-nos apenas para sermos
imitadores de Cristo?
Essas apreciações foram
buscadas fora do texto. Implicam redução, pelo fato de se fazer uma leitura
(parcial) apenas do primeiro versículo do capítulo 11, da primeira carta aos Coríntios.
Além disso, ocorreu, também, a extrapolação: considerar-se o apóstolo um
orgulhoso, com um ensino recusável. Sem dúvida, uma conclusão falha e
incompatível com o texto.
Para compreender-se a recomendação
paulina é necessário um bom estudo de toda a carta aos coríntios; um
levantamento da situação daquela igreja e da intenção do escritor quanto a ela.
O apóstolo trata com uma
igreja apegada a modelos humanos, seja pela doutrina, seja pela eloquência que
tanto apreciava. Por isso ele, erudito que era, despe-se de sua sabedoria (1Co
2:1-5). Acrescente-se, ainda que um estudo acurado de todas as cartas de Paulo
revela um apóstolo dedicado ao serviço, ao ensino, à construção de uma igreja
que tenha a Cristo como modelo; “...
portanto, sejam imitadores de Deus, como filhos amados; vivam em amor, como
também Cristo nos amou e se entregou por nós como oferta e sacrifício de aroma
agradável a Deus” (Ef 5: 1).
Enfim, minha intenção é que
este texto produza em cada um de nós um vivo interesse para a compreensão do
que nos transmite a Palavra de Deus, rejeitando as fábulas criadas por
homens que não levam em consideração a totalidade do conteúdo da Palavra de
Deus; porque alguns se valem de conceitos extrabíblicos, buscados em seu vão
conhecimento; e outros, em sua total insipiência bíblica. Ensina o apóstolo:
“Partindo eu para a Macedônia,
roguei-lhe (a Timóteo) que permanecesse em Eixo para ordenar a certas pessoas
que não mais ensinem doutrinas falsas, e que deixem de dar atenção a mitos e
genealogias intermináveis que causam controvérsias em vez de promoverem a obra
de Deus, que é pela fé.” (1Tm 1: 3-4). Convém que cada crente se ajuste a um
culto a Deus e à compreensão de sua Palavra de modo racional, com renovação do
entendimento e consequente sabedoria espiritual (Rm 12: 1-2).
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