terça-feira, 5 de agosto de 2014

PROFETISMO É AUSÊNCIA DE BÍBLIA

Gosto da clareza, das coisas explicadas. As mal explicadas geram confusão ou introduzem falso conhecimento. O assunto que pretendo abordar é um tanto melindroso, mas não quero deixar de dar a minha contribuição.
Talvez possamos partir da compreensão do que seja “profetismo”. A palavra designa, neste contexto, tendo em vista o sufixo –ismo; em primeiro plano, uma atividade constante, habitual, definida e permanente.
Aqui, chamo de profetismo a “atividade de alguns profetas”, considerando-se como tais, aqueles que trazem uma mensagem não registrada no texto bíblico, e, quase sempre, expressa num vocabulário especificamente místico.
O primeiro capítulo da Carta aos Hebreus esclarece, no versículo primeiro: “Há muito tempo, Deus falou muitas vezes e de várias maneiras aos nossos antepassados, por meio dos profetas; mas, nestes últimos dias, falou-nos por meio do Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas e por meio de quem fez o Universo.”.
No passado, Deus enviou suas mensagens aos homens, pela boca dos profetas, seus escolhidos para tal mister. A condição de profeta foi tão importante que determinou a divisão do Antigo Testamento em três partes: A lei, os Profetas e os Escritos (A Torá). O profeta do Antigo Testamento estabelecia uma relação entre a vontade de Deus e a conduta humana. Eles trouxeram mensagens de proteção, de bênçãos, mas também, grandes exortações contra os descaminhos, além de ameaças de sérios castigos por causa dos pecados do povo. Outros, como Isaías, predisseram eventos futuros para Israel; a vinda do Messias, sua divina tarefa neste mundo e o futuro glorioso do povo de Deus na Eternidade.
Vale salientar que no tempo antigo não havia a Bíblia que hoje conhecemos. Que se sabe sobre as profecias do passado? Aquilo que está registrado na História dos hebreus. Logo, entende-se que os profetas não se abasteciam de conhecimento buscado nas páginas sagradas, mas num contato profundo com Deus, que os chamara e com eles dialogava, determinando-lhes a mensagem. Por isso era normal o profeta anunciar: “Assim diz o Senhor,...”.
Evidentemente a soberania divina não tem qualquer impedimento; assim, se o Senhor quiser falar com alguém ou com a igreja local, por meio de um dos seus membros, ele o fará. O apóstolo Paulo ensina à igreja de Corinto e, evidentemente, à igreja de nossos dias, inclusive sobre a glossolalia (falar em outras línguas). Aquela igreja “a quem nenhum dom faltava” (I Co 1. 7) deu muito trabalho ao apóstolo, devido à falta de bom comportamento social e, por conseguinte, à ordem necessária nas reuniões. Ali todos falavam ao mesmo tempo, discutiam, interrogavam intempestivamente e, até nas reuniões de Ceia, davam mau exemplo. Quanto ao falar em língua, Paulo ensina:
Assim, se toda a igreja se reunir e todos falarem em línguas, e entrarem alguns não instruídos ou descrentes, não dirão que vocês estão loucos? Mas se entrar algum descrente ou não instruído, quando vocês estiverem profetizando, ele por todos será convencido de que é pecador... Assim ele se prostrará, rosto em terra, e adorará a Deus, exclamando: “Deus realmente está entre vocês!”... Tudo seja feito para edificação da igreja. Se, porém, alguém falar em língua, devem falar dois, no máximo três, e alguém deve interpretar. Se não houver intérprete, fique calado na igreja, falando consigo mesmo e com Deus” (I Coríntios, 14. 26-28).
O assunto das línguas estranhas poderá ser visto em outro momento, já que esta página volta-se para a questão da profecia.
O mesmo apóstolo Paulo determina a forma da profecia na igreja neotestamentária: “Tratando-se de profetas, falem dois ou três, e os outros julguem cuidadosamente o que foi dito. Se vier uma revelação a alguém que está sentado, cale-se o primeiro. Pois vocês todos podem profetizar, cada um por sua vez, de forma que todos sejam instruídos e encorajados. O espírito dos profetas está sujeito aos profetas. Pois, Deus não é Deus de desordem, mas de paz.” (I Coríntios, 14. 29-33).
Esse texto deixa claro que já não há profetas como os do Antigo Testamento, aqueles específicos, chamados por Deus, para uma tarefa contínua; “pois vocês todos podem profetizar”. Todavia, parece uma afirmação contraditória com o que registra a Carta aos Efésios, 4. 11-13. Ora, se não há mais a função de profeta, que atue como aqueles do Antigo Testamento, como se poderá entender que “Ele mesmo deu uns para profetas”?
Para a Igreja contemporânea Deus escolheu alguns dos seus servos para o exercício do dom de profecia, assim como chamou pastores, evangelistas, mestres e doutores. A ministração da profecia atual está sujeita a julgamento, quer da igreja, quer de outros profetas, mas, sobretudo da infalível Palavra de Deus. A Bíblia está acima dos profetas, ela os põe à prova, ela estabelece os parâmetros de sua mensagem.
Grande parte das igrejas evangélicas contemporâneas adotou uma doutrina de cerceamento, de ameaça mesmo, quando o assunto atinge a hierarquia administrativa. Fala-se em cada esquina: “Não toquem nos ungidos!” Quem são esses ungidos? Aqueles que galgaram postos de relevância na estrutura hierárquica da igreja? Nesse ponto, parece haver resquício de catolicismo romano, que afirma a infalibilidade papal. Há igrejas cujos lideres são “infalíveis donos da verdade”. São líderes intocáveis!
Deus não deu esses ministérios para que tais ministros se arroguem direitos especialíssimos; deu-os para a edificação do corpo de Cristo. (Ef 4.13). Ou são eles co-operadores (para clareza da ideia escrevi com hífen) dessa obra de edificação, ou usam mal o seu ministério e estão sujeitos à crítica, sem dúvida!
A hierarquia da igreja local não é todo-poderosa, como alguns pretendem fazê-la. O líder cristão não é o “chefe” (no sentido social da palavra) da igreja. Aliás, é assim que a Igreja Católica chama ao Papa.
Voltemos ao dom da profecia.
Que características deve ter o que profetiza? Vejamos algumas:
1. Tem que ter humildade, companheirismo e submissão ao ministério da igreja; se o profeta for arrogante, sua mensagem poderá ser corrompida. Sem proximidade com os irmãos, será visto como alguém estranho que só tem “mensagens do céu” em cada culto. Se insubmisso, com base na sua prepotência, gerará os piores atritos e até divisões. Atitude completamente errada é “incensar” aquele que profetizou. Também há grande erro naqueles que vivem à procura de “uma palavra do profeta”. A mensagem profética Deus dá à congregação, a fim de corrigir erros, animar para o trabalho, mostrar a aceitação divina com relação à obra ou mesmo a sua rejeição. O crente não precisa “procurar” profetas, precisa estudar a Bíblia!
2. Precisa nutrir profundo interesse pela pureza da igreja; para tanto, o profeta mantém comunhão com Deus, rogando-lhe essa bênção para o povo.
3. Deve cultivar o discernimento para identificar falsos ensinos na congregação;
4. Não pode deixar o desejo ardente pelo crescimento da obra do Senhor e pela união dos irmãos, em obediência à Palavra de Deus.
5. Deve apegar-se à Bíblia. Profeta precisa conhecer e manejar bem a Palavra de Deus.
Nenhuma profecia pode contrariar o texto sagrado. O que a Bíblia diz está dito. Cumpra-se!
Aqui, uma opinião absolutamente pessoal quanto às profecias que se ouvem sempre. Tenho-me incomodado com profecias que declaram em público aquilo que alguém tem pedido a Deus de modo particular. Já ouvi em pleno culto alguém profetizar: “Eis que te darei aquilo que tens me pedido, em tuas orações pela madrugada!”.
Ora, se a Deus pedi de modo pessoal ou particular, creio que assim ele me responderá! Deus não é grosseiro, nem mal-educado! E, caso a resposta me venha por profecia, entendo que essa me será transmitida secretamente; não em público. Por acaso interessa à igreja que eu oro pelas madrugadas e ali peço a Deus um atendimento? Não é isso entre mim e Ele? Mas o profeta, por falta de sabedoria, propaga a mensagem que me deveria dar em secreto.
Por fim, e dadas as considerações acima, parece-me evidente que o que se chama de “profetismo” não cabe na Igreja do Novo Testamento. A profecia constata uma chamada conforme mencionada na Carta aos Efésios, 4.11-13. Ora, o que não cabe na Igreja deste século, não cabe nas igrejas que se submetem à Palavra de Deus.
Creio, também, que a “profecia” de nossos dias ocupa os mais diversos canais para direcionar os caminhos da igreja. A profecia - como tal - pode vir do púlpito, por meio da exposição da Palavra de Deus, pode vir por intermédio de um dos membros da igreja – ainda que jamais tenham profetizado; pode vir por intermédio de um profeta já conhecido na congregação; pode vir num texto que cumprirá a missão designada pelo Espírito Santo.
A profecia não requer preâmbulos místicos, não obriga o profeta a rodopios, nem necessita de caracterizar-se pelo “jargão profético” que sempre inicia com “Eis que...”; “Serva minha” etc. Geralmente essas coisas são meramente usos habituais do profeta que, sendo sábio, procurará abandoná-los.

Deus não é judeu, nem grego, nem brasileiro. Ele conhece todas as línguas humanas e a nenhuma constituiu “língua santa”. Então, Ele não manda falar hebraico para uma comunidade brasileira, nem alemão, no Congo. Deus é sábio, o profeta, às vezes não o é. Essas práticas erradas é que conduzem àquilo que chamo “profetismo”.

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