Convém que nos detenhamos na
observação do texto de Mateus, em que se relata o Sermão da Montanha, aquele
que Jesus proferiu sobre as bem-aventuranças. Talvez seja possível apontar
algumas particularidades da pregação do Senhor, em oposição a muitas pregações
que se fazem em nossos dias. O Sermão da Montanha está registrado nos capítulos
5 a 7 daquele evangelho. Há quem diga que também Lucas o apresenta, mas há
controvérsias; e não é caso de discussão nesta reflexão, talvez em outra.
O que de fato chama a atenção
é o Pregador e a forma como Ele conduz a sua exposição. Jesus apresenta as
verdades do Reino de Deus e as características indispensáveis aos súditos desse
Reino, em contraposição àqueles que procuram viver largadamente, ou presos a uma
religiosidade estéril, legalista. Havia grande quantidade de ouvintes, quando
Jesus assentou-se sobre um monte para entregar-lhes a mensagem. “Jesus, vendo a
multidão, subiu a um monte e, assentando-se, aproximaram-se dele os seus discípulos;...”
(5.1) Jesus assentou-se: uma atitude
de quem tem o que transmitir sem afetação.
Não deve ter sido uma mensagem
rápida, uma vez que há muitos tópicos e a estrutura do discurso denota que o
Senhor tem a paciência de detalhá-los. A didática de Jesus é admirável. Até
hoje, grandes estudiosos, literatos de peso debruçam-se a analisar a impecável
estrutura daquele sermão. Há nele partes que se encadeiam e se desdobram
lindamente. A Palavra de Jesus é preciosíssima não só no conteúdo sagrado, mas
também na perfeição linguística!
Todavia, tamanha grandiosidade
não fez do Mestre uma figura que atraísse sobre si as atenções; afinal, ele não
se desfez da humildade com que se cingiu. As palavras penetrantes e a clareza
daquele homem humilde é que faziam extasiar a multidão; seus ensinos superavam
as instruções dos respeitáveis escribas, conhecedores dos ensinos religiosos. A
diferença é que Jesus ensinava com autoridade muito superior a de qualquer
religioso. “... a multidão se admirou da sua doutrina, porquanto os ensinava
com autoridade, e não como os escribas” (7.28-29). E seu ensino ia de encontro
ao que diziam aqueles escribas e fariseus. O sermão do Senhor enfatizou o
caráter de oposição ao usual e corriqueiro da religião. “Ouvistes o que foi
dito... eu, porém, vos digo...”.
A prédica do Senhor
desenvolve-se serenamente; entre termos que iniciam e fecham partes das
instruções, Jesus oferece claras explicações do conteúdo. Entretanto, o equilíbrio
do orador não ofusca o equilíbrio da mensagem.
Em nossos dias, vemo-nos
obrigados a conviver com oradores que fazem da sua voz instrumento da
apresentação de própria personalidade, em detrimento da mensagem que deveriam
entregar. Do alto de suas tribunas, reluzem dos trajes aos trejeitos físicos,
acompanhados de sons guturais, ou pausas adrede preparadas, que fazem delirar
uma plateia de admiradores ávidos de palavras que aticem a necessidade de
espasmos.
A mensagem celestial é
pacífica, solene, tranquila: espada de dois gumes tão afiados que penetram na
alma do ouvinte, avaliando as necessidades de correção. Jesus discursou calmo e
sereno; mas suas instruções, lidas no evangelho, ainda nos chamam à conversão,
à busca das preciosidades que ele oferece com autoridade e doçura.
É necessário que os nossos
pregadores jamais se esqueçam de imitar a Cristo; que muitos deixem suas
vaidades de “oradores”, que abandonem a intenção de um sucesso ilusório. É
necessário que, como Paulo, esqueçam a sublimidade discutível de suas palavras
e compareçam, em manifestação de poder de Deus (1Co 2.1-5), quando anunciam as
verdades do Reino, produzindo discípulos (Mt 28.19-20). É necessário que muitos
dos nossos pregadores diminuam a visibilidade de si mesmos diante dos homens,
para que Cristo apareça gloriosamente.
Ev. Izaldil Tavares de Castro.
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