Um dos grandes problemas do
homem, talvez o maior deles, é exatamente aquilo que o caracteriza como ser
inteligente, homo sapiens: a
expressão de si mesmo e das circunstâncias que o envolvem. A impressão
infalivelmente subjuga a expressão, enquanto essa empobrece aquela.
A percepção da vida -
envolvendo todo o seu mistério: o eu, o outro, o universo – é, para cada um,
tão diversa quanto são as digitais. Essa diversidade de percepção é - em nós
mesmos e ao mesmo tempo - maravilhosamente bela como um calidoscópio e
terrivelmente desconcertante para quem, por natureza, ama e persegue a
igualdade. O problema é viver e expressar essa dicotomia. Imagine-se, agora,
todo esse estado de alma também distinto, no tempo e no espaço, em cada
indivíduo.
Viver a dicotomia pessoal é
saber o momento de convencer-se de que há beleza, portanto, coerência, em todo o
objeto que se submete à apreciação; ou o momento de convencer-se de um decepcionante
confronto do particular e inalienável interesse. Em que instante é bela a flor?
No jardim bem cuidado que se vê da sacada da mansão, provavelmente. Em que
instante a flor se reveste de feiura insuportável? Na coroa que simboliza a
saudade daquele que partiu, provavelmente. Mas, o objeto não se altera: a flor,
em si, não é alegre, nem triste: é flor. Nossa dicotomia atribui-lhe valores.
Diante desses percalços, que
pode fazer o homem para vencer a batalha das cosmovisões que se lhe apresentam?
É necessário não ser como a palha que o vento leva, há que ter firmeza dentro
de suas próprias dicotomias. É necessário identificar o momento adequado para
abandonar essa possibilidade dual por um instante, e assegurar-se de estar em
coerência com a ideia que pretende por em xeque. Que é, pois, ideia? Digamos
que não haja ideia, mas ideias. Consideremos que elas sejam a capacidade que têm
os indivíduos de materializar uma abstração. Porém, uma ideia pode ser o bojo
tanto do aproveitável quanto do descartável. O descartável instala-se na área
do palpite, mantém-se como opinião, é o lixo cerebral. A ideia será aproveitável
quando julgada à luz da argumentação.
Não há ideia funcional sem
maturidade, sem respaldo lógico, sem apoio que a justifique, sem que tenha
agido a razão. Sem isso, é ideia descartável: é palpite, opinião, lixo
cerebral, ajuntado do ouvir dizer. Quem sustenta as ideias são os argumentos
provados e tidos como tais. O “falso argumento” chama-se falácia e só serve
para justificar sua própria insuficiência.
Ora, a quase irremediável e
crucial dificuldade do homem: a expressão exitosa de sua mundividência esbarra na
difícil escolha da maneira como tecerá os dados que deverão convencer o seu
semelhante da verdade que lhe nasceu de um campo dicotômico, do qual ele foi
capaz priorizar uma dada percepção. Dessa percepção selecionada veio-lhe a
ideia, por fim, submetida às possibilidades de uma argumentação segura, capaz
de garantir-lhe a vitória sobre as circunstâncias que guerreiam em situação
oposta.
Izaldil Tavares de Castro
Izaldil Tavares de Castro
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