terça-feira, 5 de outubro de 2021

GENTILEZA POLÍTICA OU POLITICAMENTE CORRETO

 





Um dos significados mais frequentes da palavra gentileza inclui as ações nobres, respeitosas e carregadas de amabilidade. As gentilezas fazem parte de um caráter socialmente educado; elas não resultam, necessariamente, de imposições externas, e extrapolam catálogos da boa convivência social, como quer o que chamam de “politicamente correto”. Daí que, entre a franqueza áspera e o eufemismo, entre a rudeza e a gentileza, instalou-se a hipocrisia, ou seja, a prática de um comportamento desonestamente gentil. Essa atitude intermediária, a hipócrita, talvez denote a ocultação de um caráter fraco, pouco merecedor de respeito.

Ora, ao fazer essa reflexão, parece que enfatizo as atitudes rudes. Não é o que pretendo; entendo que tanto a hipocrisia quanto a rudeza marcam atitudes igualmente dispensáveis. Assim, ponho-me como partidário da gentileza, que, em si, é honesta.

Quase sempre, as minhas reflexões que tratam da maneira como agem as pessoas, não visam a um grupo social específico; todavia, há, sempre, nesses pensamentos, uma atenção especial para o comportamento cristão, mormente evangélico. Sabe-se que os cristãos verdadeiros buscam substituir a rudeza pela gentileza e, sem dúvida, também fugir da hipocrisia. Aqui, o comportamento cristão fica sob a luz da reflexão.

Na condição de cristãos, cabe-nos verificar como andam as nossas atitudes para com o próximo; pois, sem isso, fatalmente erraremos no cumprimento do primeiro e do segundo mandamentos divinos:

“E, um deles, doutor da lei, interrogou-o, para o experimentar, dizendo: ‘Mestre, qual é o grande mandamento da lei?’ E Jesus lhe disse: ‘Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu pensamento. Este é o primeiro e grande mandamento. E, o segundo, semelhante a esse, é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo...’”. (Mt 22.35-39).

 

Estarão todas as nossas atitudes, explícitas ou implícitas, em acordo com o que disse Jesus? Não haverá densas camadas de hipocrisia nas nossas atitudes implícitas? Eis aí um sério problema intensificado pela noção moderna do que seja “politicamente correto”. É nesse contexto que nos surge a pergunta: Que é amar ao próximo? Que significa, de fato, dizermos ao irmão de fé que o amamos, sem qualquer mancha de hipocrisia?

Inicialmente, é necessário verificar o sentido do verbo amar, empregado no contexto dos versículos citados. O que é amar a Deus? Amar a Deus é sinceramente admirar a sua grandiosidade; é ansiar pela presença dele. O salmista diz:

“Do Senhor é a terra e a sua plenitude, o mundo e aqueles que nele habitam.” (Sl 24.1).

“Como o cervo brama pelas correntes das águas, assim suspira a minha alma por ti, ó Deus! A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando entrarei e me apresentarei ante a face de Deus?” (Sl 42.1).

Amar a Deus é ter reverência absoluta ao Senhor de todas as coisas; é tributar-lhe louvor e adoração exclusivos; é obedecer ao seu querer.

“Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, este é o que me ama; e aquele que me ama será amado de meu Pai e eu o amarei e me manifestarei a ele.” (Jo 14.21).

 

O que é amar ao próximo, tal como nos amamos a nós próprios? Evidentemente, por esse princípio, dado pelo Senhor Jesus, aquele que não se ama a si mesmo, não tem condição de amar ao próximo. Ora, amar-se a si mesmo resume-se no respeito pleno a si mesmo; é dar-se valor moral, é não transigir quanto aos valores éticos e aos valores espirituais. Amar-se a si próprio é não ser hipócrita nas próprias ações. O que é, então, amar ao próximo? É transferir para outrem aquilo que temos de precioso sobre nós mesmos.

Isso posto, não é necessário esforço para se detectar no ambiente das igrejas a enorme ocorrência de atitudes hipócritas. Claro que a desfaçatez é enfermidade inerente ao velho homem. Quando Deus interrogou a Caim, sobre o paradeiro de seu irmão Abel, a resposta dada foi plena de rudeza e desfaçatez:

“E disse o Senhor a Caim: Onde está Abel, o teu irmão? E ele disse: Não sei; sou eu guardador do meu irmão?” (Gn 4.9).

Entretanto, não costumamos dizer que somos nova criatura? Não foi morto o velho homem?

A nossa desculpa é que nossa prática (hipócrita) evita conflitos. É bom evitar conflitos, mas a hipocrisia não é, certamente, o remédio.

Nossos adjetivos referentes ao próximo - o qual não é nosso irmão por decisão pessoal nossa, mas por ele ser também parte do corpo de Cristo – geram frases feitas, chavões, tais como “meu amado irmão”, “meu querido”, “meus amados” etc. Lembro-me de minha mãe que dizia ter irmãos e amados irmãos. Isso é incontestável! Dessa forma, inúmeros desses adjetivos são marca da nossa hipocrisia.

Que o leitor não considere essas observações como julgamento apriorístico de minha parte. Todos sabemos que esse mal existe entre nós. Precisamos evitá-lo. Não se trata de substituir a hipocrisia pela grosseria; trata-se de amar ao próximo, no sentido que Jesus deixou implícito: como a nós mesmos; de modo respeitoso.

A nossa gentileza tem que ser pura; deve vir do estoque de um coração puro, tal como se pede ao Senhor em muitos cultos: “Dá-me um coração igual ao teu.” É, de fato isso que queremos?

Eu reconheço a enorme dificuldade que temos, eu e você, de nos aperfeiçoar na vida cristã. O apóstolo João chama de hipócrita, ou mentiroso, aquele que diz que não peca. Há, porém, cura para todos nós:

“Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça.” (1Jo 1.9).

Glória ao nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Amém!

  

 

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