“Disse
o néscio em seu coração: — Não há Deus...” (Sl 53: 1).
“Tu és terrível! E quem subsistirá à tua
vista, se te irares?” (Sl 76: 7).
Não! Não se assuste: eu não me tornei ateu. A
pergunta expressa no título é retórica, e eu poderia deixar o esclarecimento
dela somente para o final deste texto. Mas...
Acontece que é frequente ouvirem-se muitas pessoas
que afirmam de modo categórico: — Eu
acredito em Deus. Não há quem não tenha ouvido — ou falado — isso.
É também verdade que as gentes não são muito interessadas
no “sabor” das palavras: usam-nas como quem se alimenta do trivial, sem dar
atenção ao tempero ou ao preparo que elas merecem. Palavras têm sabor, têm
cheiro, causam efeito no leitor/ouvinte.
Não cultivo o hábito de ter nos dicionários
uma fonte inequívoca dos significados (e esse não é, de fato, o papel deles),
uma vez que eles não impõem significados; orientam-nos na direção aproximada
dos diversos sentidos. O “sabor” das palavras se marca pelo contexto em que se
empregam. Por isso, atrevo-me a pôr em discussão o emprego do verbo acreditar no lugar do crer.
Que sentença evidencia melhor o sentido de
alguém se curvar à hegemonia divina: acreditar em Deus ou crer em Deus? O Dicionário Gramatical de Verbos, na
edição de 1992, coordenada por Francisco da Silva Borba, aponta significados
bem próximos para ambos os verbos.
Dentro do que interessa a este assunto,
pode-se aceitar a informação de que os dois verbos requerem um sujeito experimentador (aquele que
afirma por experiência pessoal). Assim, considera-se indiferente a noção
primeira atribuída a “crer” ou a “acreditar” em Deus.
Levando-se em conta, entretanto, o sabor e o
matiz das palavras, pode-se dizer que “acreditar” signifique “dar crédito”,
“apoiar”, “avalizar”; atitudes que, definitivamente, não se aplicam à
referência ao Deus Todo-Poderoso. Deus não precisa do crédito humano!
Por outro lado, “crer” denota que a
fragilidade do experimentador confia
na supremacia do Criador, além de expressar a mais absoluta dependência dele.
Quem acredita apoia, dá um voto, põe-se na
posição de agente de um processo; assume ares de independência. Já o que crê
confia de modo absoluto; assume atitude subalterna, espera com segurança, na
certeza de que há poder naquele em quem deposita a crença.
À vista do exposto, fica fácil distinguir que
as pessoas submetidas ao senhorio divino costumam declarar sua crença em Deus; isto
é, crêem apoiados na fé inabalável, porque esperam dele, confiam nele, aguardam
as decisões dele. Um dos maiores exemplos da crença em Deus é o salmista Davi.
Ele diz: “Pereceria, sem dúvida, se não
cresse que veria os bens do Senhor na terra dos viventes” (Sl 27: 13).
Os que não colocam em Deus a sua total
confiança vão, no máximo, dizer que “acreditam”: dão algum crédito ao Todo-Poderoso,
e o seu crédito é, em geral, volúvel: passível de outras orientações. O Senhor
Jesus aplicou o verbo acreditar (no sentido de apoiar, dar crédito) quando
orientou: “E, então, se alguém vos
disser: Eis aqui o Cristo, ou: Ei-lo ali, não acrediteis”. (grifo
meu). (Mc 13: 21).
De um modo geral, os que acreditam em Deus
estão a um passo de se incluírem na sociedade dos néscios. Por isso, eu CREIO em Deus. E você?
Com relação ao uso das palavras, é bom
desistir do “tanto faz”. Sempre haverá diferença importante.
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